De vulcão a rio – 1

Em cima, terra, terra, terra, terra, terra, terra, só terra. De um lado terra, terra, terra, terra, terra, terra, terra. Do outro rocha.Embaixo o buraco.A equipe de resgate não existe.Em cima, terra, terra, terra, terra, terra, terra, só terra. De um lado terra, terra, terra, terra, terra, terra, terra. Do outro rocha. Embaixo o buraco.Cavar, cavar, cavar, cavar, cavar, cavar, cavar, cavar, cavar, cavar. Eu paro para descansar, as unhas sangrando.E em cima ainda tem muita, muita, muita, muita, muita, muita, muita terra.Só terra em cima seria bom. Eu sei que só terra em cima seria bom. Essa rocha, eu precisei desviar.Necessito do que é reto e precisei fazer curvas.Eu sei que desviar da rocha foi uma conquista.Eu me lembro de quando meus dedos esperavam grãos mesmo que compactos e   encontraram solidez, solidez, solidez, solidez bem em cima da minha cabeça.Eu me lembro da minha raiva e do meu choro. Da inércia de 3 dias, sono não descanso, desistência.Eu me lembro do exato momento que decidi tirar as camadas de solo dos meus olhos e da minha boca e comecei a apalpar todos os lados.E em cima um palmo à direita era rocha, mais dois palmos era rocha, outro.. e era rocha. Três palmos à esquerda era rocha, mais dois era rocha.Eu não tinha mais para onde me movimentar, meus limites claros. Cavar, cavar para o lado. Que lado? Cadê pesquisa geológica, ultrassom de solo? Cavei a esquerda porque o terreno era menos indócil. Não há como saber se foi péssima decisão a longo prazo.Cavei, cavei, cavei, cavei para à esquerda como minhoca barata tonta.Esforço de movimento que ainda não é saída. Eu sei que a rocha ao lado agora é uma conquista. Mas não se dá parabéns ao apenas um pouco menos soterrado.Não se diz que está tudo bem a quem tem as unhas sangrando.Não se comemora o quase de quem ainda não vive. Não me lembro como cheguei aqui. A equipe de resgate não existe. Então são duas as possibilidades. Eu sou cadáver adiado. Ou sou semente. Quero ser semente. Mas para me tornar flor eu preciso de coragem para romper a terra. Para ter coragem eu preciso de força. Para ter força eu preciso de ar. Aqui. Agora. Asfixiada.Para respirar plenamente eu preciso sair da terra. Mas para sair da terra eu preciso de força. Para ter força eu preciso de ar. É raro o ar por aqui. Eu preciso escapar do subsolo para respirar. Mas sem ar eu não escapo do subsolo. ….Serei cadáver?

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