O que estou escrevendo?

Para Estela Rosa, não há um momento certo de se dizer escritora.

“Acontece quando você percebe que o que você escreve vai além de você.”

Acho que ela estava falando da escrita começar a atingir outras pessoas.

Quando o texto é mais que um reflexo da autora.

Mas escrever um projeto para ser contemplado no PROAC é a exigência agora de se dizer escritora.

Um “ ir além” provocado à fórceps.

Quando o/a artista iniciante tem que se dizer antes de ser.

Como então falar da minha obra futura de modo honesto, sem diminuí-la ou  superdimensioná-la?

O que eu estou escrevendo?  Pra quem e por quê?

Eis o que escrevi sobre o que agora escrevo:

“As protagonistas de Travessência são todas mulheres personagens contemporâneas da sociedade urbana, lidando com as questões de família e trabalho, mas, principalmente, com as demandas e fortes expectativas sociais do papel da mulher no mundo.

Não só as do conto que dá nome ao livro, mas todas as protagonistas estão em estado de travessência. A vida é uma travessia, mas às vezes a existência empaca, não flui, como travamento de uma essência que não ultrapassa os obstáculos que atravessam a busca. O conflito dos contos é um conflito latente, sempre presente, já é parte da identidade das personagens. O essencial de uma essência perdida ou nunca conquistada é uma marca da vida da mulher em sociedade, sua eterna busca.”

Mulheres que escrevem

E o que eu não falei nesse mês e meio?

Não falei da FLIP e não falei do PROAC.

(Não eu não ganhei PROAC . Também não falei em mesa da FLIP. Ainda ;^)

E não falei o que a FLIP tem a ver com o PROAC.

É que eu fui ver as poetas Mel Duarte, Jarid Arraes  e Estela Rosa

que se reúnem no Mulheres que escrevem, encontro presencial e plataforma online.

E elas falaram de todas as questões sobre ser mulher escritora.

Todas as questões que eu achava só minhas.

O receio de dizer que se é escritora.

Achando que sempre o que escreve é ruim.

Em que momento a gente começa a dizer que é escritora?

Se tenho blog sou escritora?

Em que momento a gente se vê como escritora?

A necessidade de encontrar alguém parceirx que leia  de fato e faça críticas verdadeiras.

Por que sempre tem o cara do rolê que quer pegar você então diz que seu poema está ótimo.

Que a faculdade de Letras faz parar de escrever (por formar críticos e não escritores).

Sabe aquela pessoa que escreve mal?  “Nossa, que coisa ruim como é que teve coragem de por isso num livro?  Pois é essa pessoa está dez passos na sua frente porque foi lá e fez.”

E, uma vez escrito, é sim necessário revisar, mas uma hora tem que parar de editar e entregar ao mundo.

A verdade que quase ninguém fala: Escrever não é dom, é prática. Ninguém tem o dom divino da escrita.

E a verdade última: “Cada escritor tem seu leitor, se a obra está incomodando alguns encontre outros que leiam.”

 

Dos clichês

 

Certos clichês se impõem contra a nossa vontade.

E o clichê de hoje é “ Nossa, faz um tempão que eu não escrevo no blog, mais de mês, mais é que…”

Daí vem a desculpa aos leitores do blog, do mesmo modo de pedir desculpa ao diário. O que na verdade é um pedido de desculpa pra si.

Em menina, começava escrevendo “Então diário faz tempo que não escrevo.”

Diários não ficam chateados, pessoas na internet também não ficam, não com isso pelo menos.

Blogs desatualizados são só blogs desinteressantes.

Mas o que isso diz do meu comprometimento comigo mesma?

Um professor de ioga dizia que a gente sempre para de fazer aquilo que é pra nós mesmos.

“Entre vir fazer ioga e ir no dentista, você vai ir no dentista aguentar o motorzinho, mas não vem aqui.”

Bom, eu também não fui no dentista.

Pra que serve a maturidade?

Contei pra minha mãe  (em 1999) que eu me identificava com a Chiquinha Gonzaga.

“Mas como você se sente identificada com ela, se Chiquinha Gonzaga só produziu na maturidade???”

Bom, Nostradamãe, a minha maturidade chegou,

espero que com ela também venha a solução para esta agonia.

Aliás, hoje eu sei a resposta: Mãe,  não  vem à luz na maturidade o que não foi gestado na juventude.

Por que Chiquinha Gonzaga?

Eu também não sabia quem era Chiquinha Gonzaga

até a série da Globo, em 1999, meu exatos 20 anos.

Eu nem fui atrás da biografia da Chiquinha porque se for diferente da série eu não quero saber.

Eu me vi na angústia dela por compor e tocar,

presa a um ambiente que não permitia que ela tocasse e compusesse.

Ou pior, restrita a um círculo social pronto pra bater palmas e

elogiar tudo que ela fizesse como  “bonitinho”.

Lembro-me da cena em que o cara que Chiquinha gostava

(enquanto ela , casada com quem o pai obrigou)

perguntou ao amigo músico, das rodas de lundu,

se Chiquinha, afinal, tocava bem.

E o amigo respondeu que sim, mas que ela, sem treino

e sem com que trocar,

estava perdendo o dom.

É horrível não ter com quem trocar.

É horrível não ter com quem trocar.

É horrível não ter com quem trocar.

(nota inclusive para o dia de hoje:

É horrível não ter interlocutores.

É horrível não ter interlocutores.

– ou pior, ter interlocutores pela metade –

É horrível não ter interlocutores.

É horrível não ter interlocutores.

É horrível não ter interlocutores. )

Porta aberta?

Em uma dessas antologias de poemas

publicaram o meu poema não com meu nome

mas com meu pseudônimo.

Para que eu quero 15 livros com poema meu

mas atribuído a Chiquinha Gonzaga?

O pior é não saber se o engano

veio por pessoa que achou

que a maestrina está viva

e  também  escreve versos

ou por não ter a mínima ideia de quem foi Chiquinha Gonzaga.

Estreias (no sexo e na vida)

Sim, eu já tive outros textos meus publicados em papel.

Acho que a decepção com a frase-decreto da Nanete

foi porque o lançamento em bar na Augusta

com amigos me pedindo autógrafos

e também me deixando de lembrança um recado com assinatura,

com fotos e muito riso,

era muito mais bonito, mais interessante, mais debut

do que receber um exemplar pelo correio,

resultado de uma premiação em Minas que não pude ir

ou de cerimônia em São Paulo em que poderia ir

mas que só chamaram até o quarto colocado

(publicaram 15 escritos,  o meu era o 10º)

Como amiga que me disse que perder a virgindade de pé numa parede,

 como ela decidiu,

era  nada romântico  e menos digno do que estar numa cama.

E eu dizendo que não adianta estar na cama

 e não  se dar conta do que está acontecendo.

A gente esquece que a primeira vez não é importante.

A primeira vez só importa como porta aberta  para as próximas vezes.

Você já perdeu a virgindade!

Foi o que me disse Nanete Neves

ao autografar meu exemplar de Primeiramente

que contém contos meu e dela

e de mais 15 autores.

Com a caneta prestes a deflorar a primeira folha

a colega veterana me pegou ao perguntar

se era minha primeira publicação.

Franzi testa e as palavras:

“Serve texto publicado em antologia de concurso literário?”

“Não. Você já perdeu a virgindade.”

Decepcionada, emendei:

“Mas eram antologias de poemas.”

“Pronto” – disse me devolvendo o livro

“Coloquei que é sua estreia na ficção.”

Agradeci o carinho e fiquei me perguntando se poesia não é ficção.

O escritor nasce com o romance?

Ouvi de uma amiga que já publicou contos em várias antologias e que agora lança seu primeiro livro solo que

           “Agora posso dizer que sou escritora, porque você não é escritor se só publicou em antologias.”

E eu  “É”?

          “É o que dizem.”

 (OBS 1:  Eu só tive publicações em antologias.)

( OBS 2:  Eu esqueci de contar a história do requivem)

Quase

O mais perto que cheguei foi da certeza alheia da faculdade que eu ia cursar, mas não do ofício a seguir.

Quando contei a história do requivem na aula de teatro, uma colega disparou a certeza feliz “Você então já sabia desde os 6 anos que faria Letras, né?”

Mal sabe ela que o curso de Letras foi um resgate na construção da pessoa que eu seria na  minha vida.

Eu precisei de muito tempo para me dar ao direito de cursar Letras.

E estou precisando de mais ainda para me nomear escritora.